Qual é a reforma tributária que o Brasil precisa?

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Apresentamos quais são os princípios norteadores para qualquer reforma tributária para que ela seja boa e justa para o país, empreendedores e cidadãos.

O Brasil é um dos 10 piores países do mundo para pagar impostos, ocupando o 184º lugar entre 190 países. Reformar o nosso sistema tributário é urgente para estimular a produtividade, inovação e o crescimento econômico. Mas, entre tantas discussões sobre a reforma tributária, quais são os pontos que não podem ficar de fora? A partir dos nossos estudos sobre o tema, definimos os 11 princípios mínimos. Esses princípios são valores básicos que precisam estar em qualquer proposta de reforma para que ela seja considerada boa e justa para o país, para as empresas e para os cidadãos. Além disso, eles devem ser considerados em conjunto, nunca individualmente.

1. Legislação uniforme, clara e simples que abarque União, estados e municípios

União, 27 unidades federativas e 5.570 municípios, todos podem emitir regras tributárias próprias. Como resultado, entre 1988 e 2016, foram editadas 31.221 federais, 110.610 estaduais e 221.948 normas tributárias municipais. Além disso, a legislação muda constantemente. Somente o ICMS no Rio Grande do Sul mudou 558 vezes em 4 anos. Um IVA apenas federal (PIS, Cofins e IPI) não resolve o problema, que hoje está concentrado nos tributos estaduais (ICMS) e municipais (ISS).

2. Sistema tributário com o mínimo de exceções

Estados tributam bens (ICMS) e municípios serviços (ISS), em desacordo com a realidade das empresas. Negócios inovadores que não conseguem definir se estão oferecendo um produto ou um serviço – no caso de e-commerce de jogos digitais, por exemplo – acabam transferindo seus negócios para países com sistema tributário mais simples. Além do problema de nem sempre ser possível definir claramente o que é produto e o que é serviço, ainda temos o desafio de que cada produto ou serviço recebe um tratamento específico. No Maranhão, por exemplo, o leite tem 12 alíquotas diferentes, a depender do teor de gordura, do animal etc.

3. Mais transparência, racionalidade e efetividade nos incentivos à atividade produtiva e ao desenvolvimento regional, preferencialmente feitos via gasto público transparentes nas leis orçamentárias

A grande quantidade de benefícios fiscais dá estímulos a má alocação de recursos, o que leva à baixa produtividade das empresas. Esses benefícios, na maioria dos casos, resultam em baixo custo-benefício. Em 2017, R$ 270,4 bilhões deixaram de ser arrecadados só pela União. Para se ter uma ideia, esse montante 2,23 vezes maior do que o gasto que a União tem com Saúde (R$ 120,9 bilhões); 2,39 vezes maior do que o gasto com Educação (R$ 112,2 bilhões), e 10 vezes maior do que o orçamento do programa Bolsa Família (R$ 27 bilhões).

4. Máxima neutralidade do sistema, com mínima interferência na forma de organização das empresas

A complexidade do sistema tributário faz com que as empresas adaptem seu negócio ao que é mais vantajoso em termos tributários, e não em termos produtivos. Empreendedores que atuam em construção com pré-moldados, por exemplo, optam por montar suas construções no local da obra para que seja considerado um serviço. Seria melhor pré montar o na fábrica, mas nesse caso se tornaria um produto e, com tributação maior, seria mais caro.

5. Estímulo à cooperação entre os entes da federação

O sistema atual é competitivo: (a) cada ente tributa e fiscaliza uma parte da atividade da empresa; (b) não há troca de informação entre os entes, que pedem as mesmas informações mais de uma vez; e (c) com o princípio da origem, a arrecadação com base no local de produção (e não de consumo) gera guerra fiscal. O sistema pode ser cooperativo se, por exemplo, houver compartilhamento da base tributável; coordenação de um único comitê gestor – com sistemas unificados de arrecadação, fiscalização e regulamentação e partilha; além da adoção do princípio do destino.

6. Segurança e previsibilidade para o contribuinte e para o fisco

Complexidade abre margem para interpretações distintas de empresas, órgãos fiscalizadores e julgadores, além de dar brecha para condutas duvidosas de todas as partes. Atualmente, mais de R$4 trilhões estão em litígio tributário, o equivalente a mais de 60% do PIB brasileiro. Outro dado importante é o contencioso tributário da Petrobrás, que hoje corresponde a quase 50% de seu patrimônio líquido.

7. Devolução garantida do crédito tributário

Para além da dificuldade de interpretar hoje o que gera crédito, quando ele finalmente é definido, há uma enorme dificuldade de recuperá-lo. O tempo de devolução de créditos deve estar fixado na lei complementar ou resoluções, com previsão de sanções para o seu descumprimento.

8. Aumentar a eficiência da administração tributária, preservando as receitas atuais com menos ônus para o   contribuinte e para o Estado

O país está passando por uma grave crise fiscal e reduzir a arrecadação não é viável. Assim, é importante manter as receitas do Estado, reduzindo os custos de compliance para o contribuinte e para o Estado.

9. Transparência e clareza para o consumidor a respeito do quanto paga de tributos

O valor do tributo depende de uma série de fatores: onde foi produzido e por onde distribuído, regime de cada produtor, materiais empregados etc. Assim, é impossível saber qual o percentual de tributos que incidem sobre cada produto e serviço. Deixar o sistema mais transparente significa deixar evidente a alta carga tributária do país e o impacto dela sobre os preços.

10. Processo de transição simplificador, responsável, com regras claras e no período de tempo mais curto possível

A reforma precisa ter efeitos positivos de curto prazo e ser, em si, simplificadora. Toda implementação implica ajustes  (na Índia foram mais de 200 em 1 ano e meio), mas o sistema deve se provar no curto prazo para evitar que seus pontos positivos também sejam ajustados. Além disso, uma transição longa deixa o sistema suscetível a promessas eleitorais populistas. Uma transição de 10 anos passaria por de 2 a 3 eleições presidenciais; uma transição de 5 anos, apenas uma. Tão importante quanto criar um bom sistema, é mantê-lo depois. Por isso, a implementação é decisiva, são necessário prazos mais curtos e/ou processos que simplifiquem o sistema durante a transição como, por exemplo, a unificação dos tributos federais nos primeiros anos.

11. Sistema tributário progressivo, que onere mais aqueles com maior capacidade de contribuir.

As políticas de desoneração são pouco efetivas na redução das desigualdades. A desoneração da cesta básica do governo federal custou R$ 18,6 bilhões e reduziu apenas 0,1% a desigualdade de renda.  Existem mecanismos mais efetivos de distribuição de renda. A restituição parcial do IBS para contribuintes de baixa renda, similar ao Bolsa Família, é uma política 12 vezes mais efetiva que a desoneração de produtos básicos.

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